quarta-feira, dezembro 23, 2009

*O clima de Natal*



    Escutei de pessoas diferentes a queixa de que já não existe clima natalino.

Fiquei surpreso, afinal, nunca houve tantas melodias tocando nas ruas. Nunca 
houve tantos enfeites e uma variedade tão grande de presentes. Qual seria o 
problema? 


    Ultimamente tem se falado muito das mudanças climáticas. O encontro de 
líderes mundiais em Copenhagen centralizava esse assunto. 


Muitas regiões de nosso estado sofreram destruições por causa do excesso de 
chuvas e pela presença de ciclones. Quem semeia ventos, colhe tempestades. 


Mas, o que afeta o clima de Natal não são ventos ou chuvas, não é o 
aquecimento global, é sim o esfriamento do coração, é a falta de 
contentamento! 


    No coração de muitas pessoas o brilho de Natal tem perdido a intensidade, 
não pela falta de pisca-pisca, mas porque toda a parafernália comercial tem 
construído uma Camada que impede que o Sol da Palavra de Deus ilumine e 
aqueça nossos corações. 


    Em nossas mentes, adornamos a Maria com seda, o José com uma túnica de 
costura perfeita, a manjedoura é feita em tom dourado, tudo para deixar a 
vitrine mais fashion, mas esquecemos a escolha de Deus, esquecemos que ele 
recebe os humildes e despreza os soberbos, esquecemos que ele não quis 
nascer em berço de ouro. No centro da festa um homem gordo e de barba 
comprida e alva veste roupas de frio em um calor tropical. De fato, o clima 
natalino sofre alterações! 


    Mas não podemos nos contentar em ser apenas como termômetros que sabem medir 
com precisão a temperatura, precisamos procurar o dom de sermos como pessoas 
termostatos, que são aquelas que influenciam, que mudam o clima, que trazem 
alegria, que geram a Paz. 


    Jesus veio para causar mudanças! Ele veio promover salvação! Ainda hoje se 
achega, vem no inverno e no verão, vem em qualquer temperatura, seja no 
tempo de Natal ou na Páscoa, no ano velho ou no ano novo. Ele vem. 


Que Deus conceda a cada um de nós o sublime dom de receber o Cristo. Assim 
seremos o próprio presépio, um presépio simples, mas que traz no coração o 
brilho de quem tem dentro de si não apenas o Menino de Belém, mas também o 
Rei e o Redentor do Mundo. 


(Ismar Pinz - Pastor)

quarta-feira, dezembro 02, 2009

A des-moralização das religiões


Na disputa por novos seguidores, muitas religiões, em sua atual expressão, estão deixando de ser fontes de valores éticos, transformando-se em pontos de oferta de serviços e cunho mágico. A esse fenômeno recente, o sociólogo Antônio Flávio Pierucci, professor do Departamento de Sociologia da USP, está chamando de "des-moralização" das religiões. Sua visão sobre o assunto foi apresentada na mesa-redonda "A falência ética das religiões no Brasil de hoje", durante o IX Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado na UFRGS (Univsersidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil), em setembro passado. Na entrevista que concedeu aos jornalistas Ademar Vargas de Freitas, Arlete de Oliveira Kempf, Clóvis Ott e Ida Stigger, Pierucci falou sobre o aumento do chamado "mercado religioso", sobre a crescente busca de experiências religiosas pelas pessoas e sobre o abandono da reflexão teológica nas religiões que mais crescem hoje no Brasil. Tomamos a liberdade de publicar neste site a entrevista, considerado seu papel relevante para os objetivos do nosso trabalho.

JU - As religiões estão desmoralizadas?

FP - Há que entender o que estou querendo dizer com isso. Meu trabalho se chama "a desmoralização das religiões no Brasil" por uma razão muito simples e empiricamente constatada. As religiões que estão crescendo no Brasil são em primeiro lugar as igrejas protestantes de estilo pentecostal. Entre as pentecostais, as que mais crescem são as que se convencionou chamar de neopentecostais, como Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça Divina, Renascer em Cristo, Deus é Amor, e por aí vai. Elas oferecem um tipo de religião que é muito pouco exigente eticamente. Ou seja, as religiões estão deixando de propor pautas de conduta, de dizer o que é certo, o que é errado e estão oferecendo serviços que na linguagem de sociologia da religião se chamam de serviços mágicos.

JU - O que são esses serviços mágicos?

FP - São serviços tópicos. Você resolve problemas, aqui e agora: dor, desemprego, um filho drogado, um problema pessoal de droga. Mas não é só isso. O mercado religioso no Brasil ficou muito competitivo, é por isso que você tem a impressão de que as religiões são muito dinâmicas. Elas não podem deixar de ser dinâmicas, porque estão competindo entre si. Com isso, elas passam a oferecer, além dos serviços mágicos, sensações: a missa tem de ser agradável, o culto tem de ser emocionante, tem que ter algum transe, alguma chamada experiência religiosa, êxtase, calor no coração, uma certa corrente social de solidariedade que passa entre as pessoas. Também nesse sentido as religiões passam a oferecer sensações imediatas às pessoas. Tudo isso é um quadro de desmoralização das religiões. As religiões deixam de ser religiões moralizantes e passam a ser religiões mágicas. Elas não exigem que você necessariamente mude de vida e aprenda a se comportar independente de estar em estado de graça, em contato com Deus ou não. O processo de passagem da magia para a ética, das religiões mágicas para as religiões éticas, foi um processo de moralização.

JU - A intensa proliferação de seitas também não é uma forma de desmoralização das religiões?

FP - Quero explorar um pouco mais a palavra desmoralização. Entendo que, além de as religiões estarem desmoralizadas no sentido em que falei antes, como estão muito midiatizadas, como estão se expondo em excesso, começam a ficar banalizadas. Você liga a televisão, o rádio, a qualquer hora, tem alguém falando alguma coisa. Há uma hiperexposição da religião. Isso representa um risco de desmoralização da religião, que passa a ser algo importante, mas nem tanto... Porque os próprios agentes passam, agora, a disputar fiéis de todas as formas possíveis, e as religiões ficam cada vez menos exigentes. Hoje quem é exigente é o seguidor religioso. Ele procura uma religião que funcione. E encontra um mercado amplo aí. Se, digamos, a Igreja Católica não está resolvendo os problemas dele, ele pode sair. Se ele entrou numa igreja evangélica ou num culto afro-brasileiro e não está gostando, vai procurar outro melhor. Agora, na competição por fiéis, são os profissionais da religião que passam a ser menos exigentes. E oferecem uma religião que exige menos rigor na conduta pessoal, portanto menos ética, e proporciona mais festa, mais prazer. Tem um sociólogo polonês chamado Siegmund Bauman que diz que na pós-modernidade nós nos transformamos em "sensations gatherers", ou seja, coletores de sensações. Nós todos queremos sempre sensações novas. Por exemplo, na culinária, você quer sempre experimentar coisas novas. E as religiões oferecem um pouco isso, um cardápio razoável de possibilidades de fazer uma visitinha numa, uma visitinha noutra, dependendo do seu periscópio.

JU - Afinal, qual é o objetivo das religiões?

FP - Para responder a essa pergunta, parto do ponto de vista da tendência da sociologia da religião desenvolvida nos Estados Unidos, sobretudo. A pergunta que se fazia era: por que essa igreja cresce e aquela outra não cresce? Era um problema eterno para os sociólogos. Nós, no Brasil, durante muito tempo tentamos ver se as religiões estavam respondendo às necessidades da população. Dizia-se que certas religiões cresciam porque atendiam populações do campo, migrantes, que se desenraizavam, perdiam as referências, nas cidades grandes, demandando um senso maior de comunidade, um senso maior de transcendência. Isso acabava explicando no atacado e não no varejo. Por que algumas religiões crescem e outras não? Nós, sociólogos da religião, estamos agora, mais materialistamente, tentando deslocar a análise da demanda religiosa para a oferta religiosa. Com isso o enfoque não é o fiel, aquele que busca, mas o padre x, o pastor y e pai-de-santo z. São eles que vão responder por que a religião deles cresce, se eles estão oferecendo bem, se eles estão ativos, se não estão de braços cruzados esperando as pessoas chegarem, se eles vão à luta. Fica um pouco mais fácil entender por que a Igreja Universal do Reino de Deus cresce e por que a Igreja Católica ou a Igreja Luterana demora mais a crescer. A Igreja Luterana não cresce porque os pastores luteranos não querem crescer. Se eles querem crescer, eles devem ir à luta.

JU - Os luteranos são mais éticos...

FP - Não só são mais éticos, mas são também mais tradicionais. Ou seja, você nasce luterano. Eles fazem pouco esforço no sentido de se expandir para fora de seu universo religioso.
JU - A Igreja Luterana tem uma história, criou uma nova profissão de fé, a partir da separação da Igreja Católica. É algo ideológico, filosófico. Já as seitas nascem de um dia para o outro e arrastam multidões.

FP - Isso ocorre porque são pouco exigentes eticamente e são pouco exigentes intelectualmente. Existe um livrinho do Edir Macedo chamado "A libertação da teologia", o contrário da "Teologia da libertação". Quando ele diz "libertação da teologia", o que está querendo dizer? Que os pastores não precisam estudar sete anos de latim, hebraico etc..., para ler as escrituras no original. Com isso, liberta-se as igrejas também da teologia, desse fardo intelectual que é custosíssimo, caríssimo. Por outro lado, um quadro de pastores da Igreja Universal do Reino de Deus pode ser formado com treinamento de videocassete. É um processo de clonagem à imagem de Edir Macedo. É como um processo de franquia, com formação de quadros ágil e barata. Voltando ao que eu dizia antes, a minha hipótese teórica central é que as igrejas crescem dependendo dos profissionais que elas têm, e se eles estão dispostos a arregaçar as mangas, entrar no mercado competitivo. O Brasil ficou, em termos de religião, um mercado muito competitivo. A Igreja Católica, em alguns cochilos do governo, ainda consegue impor um pouco de sua influência, mas podemos dizer que o mercado está desregulado, ou seja, o estado se retirou desse campo mesmo.

JU - O padre Marcelo não é uma reação da Igreja Católica a esse quadro?

FP - Claro, e bem sucedido. Não sei se ele vai ter duração. É um tipo de catolicismo que oferece para as pessoas um culto alegre, interessante, suave, no sentido das exigências éticas e da pregação. Antigamente ia-se à igreja para ouvir uma pregação que era moralizante: não faça isso ou aquilo; isso é pecado, leve ou grave. Isso as religiões não falam mais.

JU - Então parece que não é difícil ser católico?

FP - Não é difícil ser um bom católico. Isso o Max Weber já dizia. Era difícil ser protestante. Hoje não é mais difícil ser protestante. Essa é a grande mudança. Não é muito difícil ser católico porque há o sacramento da confissão, o Weber já dizia isso. As regras são conhecidas, se a pessoa cair em pecado há a absolvição à disposição, é só entrar na igreja e ajoelhar diante de um confessionário. Por isso o Max Weber já dizia que o catolicismo é uma religião pouco ética, pois não engata na estrutura da personalidade: você peca, se arrepende e é absolvido; peca de novo, se arrepende de novo e é absolvido, e assim por diante. Toda a luta da Igreja Católica para proibir a pilula anticoncepcional é conhecidíssima. As mulheres católicas usam pílula; as mulheres católicas fazem aborto, que é proibidíssimo, mas têm esse alívio imediato que é um sacramento. O Calvino chamava a confissão de magia, questionando como um padre poderia tirar de uma pessoa a culpa por ter desobedecido a Deus. O catolicismo é uma religião muito mágica, pois tem sacramentos, tem água benta, a chave do sacrário, a hóstia, relíquias. O que é novo é que o protestantismo brasileiro, esse recente ,está virando mágico. O protestantismo não tinha essas coisas. Hoje, em várias igrejas, os pastores abençoam a água pelo rádio. Os protestantes têm água benta, têm relíquias, como vidrinhos com um pouco de terra de Jerusalém, cerimônias onde se jogam lençóis sobre as pessoas, como perdão dos pecados, os dias certos para concessão de graças: segunda-feira, prosperidade, terça-feira, expulsão dos demônios, e assim por diante. Os fiéis acabam levando para casa, pedacinhos de pano, relíquias, coisas pelas quais os protestantes verdadeiros - luteranos, presbiterianos, metodistas, calvinistas, puritanos - tinham o maior desprezo. Isso não existia no universo protestante. O protestantismo brasileiro atual, que é esse que cresce, é muito mágico, com pontos de apoio concretos, amuletos, que se levam no bolso, na carteira, para dar prosperidade. Isso não é protestantismo.

JU - Esse fenômeno está ocorrendo no mundo ocidental apenas?

FP - Não apenas. A expansão das liberdades democráticas trouxe a liberdade religiosa. A partir do momento em que o estado se separa da religião, há o que eu chamo de desregulação do mercado. A única coisa que que estado não tolera é a violência entre os grupos religiosos, como a que se ensaiou no Rio e São Paulo entre os neopentecostais e os umbandistas, quando crentes chegavam a agredir mães-de-santo com a Bíblia, e se falava em "guerra santa". Quanto ao resto, tudo é livre, livre no sentido de busca de fiéis.

JU - O senhor fala em desmoralização. E não se pode falar também em comercialização da religião? O dízimo alimenta as seitas, que por sua vez crescem vertiginosamente, adquirem redes de emissoras de rádios e televisão, prédios valiosíssimos em todas as cidades, inclusive em capitais européias. A religião não virou uma fábrica de dinheiro?

FP - Comercialização não é novo, sempre houve. Lutero se revoltou contra a Igreja Católica pela venda de indulgências. Um exemplo atual são os locais de peregrinação, onde se comercializam bens religiosos: o santinho, a medalha, o espelhinho, terços etc. Existe um mercado especificamente de bens religiosos. Isso a umbanda tem, o candomblé tem, o catolicismo tem e agora, algo mais diversificado, que vem com os novos evangélicos, que não só produzem cultos e pregações, mas discos, vídeos, música gospel etc. São dados empíricos que contribuem para a compreensão da nova teoria sobre a religião, que é a teoria da oferta. O outro lado desse fenômeno de desmoralização das religiões, no sentido em que proponho, é a magificação das religiões. A magia sempre teve como legítimo a troca econômica. O feiticeiro, o mago, sempre vendeu seus serviços. Os chamados "desafios" a Deus, dos neopentecostais, também têm uma característica mágica. O pastor intima o fiel a desafiar a Deus dando uma grande soma de dinheiro.

JU - A religião resolve problemas?

FP- A religião sabidamente resolve problemas neuropsicológicos. Num país onde as pessoas ganham pouco mais de 100 reais por mês, grande parte dos problemas são neuropsicológicos, que se resolvem com milagres... Resolve, às vezes, mais do que o médico, do que os serviços de saúde...

JU - Se as religiões deixaram de ser referências de sentido e de moral para as pessoas, o que preencheria esse espaço, qual seria a fonte de valores éticos para a população?

FP - Eu estou convencido de que quem busca o sentido de alguma coisa são as pessoas mais intelectualizadas. Quem está sofrendo problemas muito crônicos, muito imediatos, quer soluções. Quem já está mais sossegado tem mais tempo livre, tem leitura, começa com essa busca de sentido. Eu acho que as religiões ainda podem oferecer e oferecem isso. Elas têm um núcleo mais intelectualizado que oferece isso.

JU - Por que as pessoas, na sua busca religiosa, querem mais saber das "experiências" ditas espirituais e importam-se menos com o fundamento teológico daquilo que estão seguindo?

FP - Hoje a religião faz um esforço para se libertar da teologia, da busca intelectual, da reflexão intelectual, que é uma coisa exigente. É uma tendência que se confirma, de as pessoas quererem, hoje, na religião, a experiência religiosa. Elas não querem doutrina religiosa: querem uma visão, um sentimento, uma sensação, um êxtase. Isso pode ser obtido usando meios químicos, fumando maconha em Alto Paraíso, dançando, repetindo mantras, usando técnicas de inibir o pensamento, para se desligar da realidade, transcender a realidade. As pessoas querem experiências religiosas, porque as igrejas estão oferecendo essas experiências. E a experiência religiosa, por definição, é uma coisa irracional. A teologia é algo racional, exige fôlego intelectual.

Fonte: http://www.zzengo.hpg.ig.com.br/religioes_entrevista.htm